Piso em Fundação Direta X Piso Estaqueado

Piso em Fundação Direta X Piso Estaqueado
20 de fevereiro de 2017 Artigos Técnicos Nenhum comentário

Fundação direta ou estaqueado? Essa é uma questão que geralmente atormenta investidores, construtoras e outros envolvidos na construção. O piso em fundação direta é executado diretamente sobre o subleito, ou seja, na superfície do terreno preparado; já o piso estaqueado é apoiado sobre estacas, ou seja, tem fundação profunda.

O tormento dos envolvidos é motivado por dois fatores: o primeiro é o custo, pois dependendo do comprimento da estaca, pode custar de 3 a 4 vezes mais do que o piso em fundação direta, ou até mais; o segundo fator é a execução em si, mais demorada e com mais complicadores do que o piso em fundação direta, como o tempo dispendido no estaqueamento, armação mais pesada e que precisa ser adequadamente posicionada, maior dificuldade de concretagem geralmente exigindo bomba para o lançamento do concreto etc.

Muito bem, já vimos que o piso em fundação direta é preferível, por ser mais fácil de executar e ter menor custo final. Mas o que determina a escolha entre um ou outro? Essa é a questão crucial que deve ser respondida, às vezes muito evidente, outras que exigem maior tempo de reflexão e análise por parte do projetista e também do proprietário ou usuário final.

Vamos supor que um solo apresente os seguintes valores de SPT (Standard Penetration Test), N, disponível nas sondagens a percussão: 5, 5, 7, 8, 9, 11, 13, 15… e necessitamos de um piso com capacidade de carga de 5 tf/m2. De maneira simplificada, podemos assumir que a capacidade de carga de um solo é C=2xN, onde N é o valor médio do SPT. Neste caso, o solo seria competente para resistir aos esforços previstos.

Mas se nesse mesmo local desejamos construir um piso para resistir 15 tf/m2, o solo não suportaria o carregamento e ocorreriam recalques no piso e a opção mais indicada seria um piso estaqueado. Continuando no mesmo exemplo, imaginemos agora um piso para 8 tf/m2, muito próxima da capacidade do solo e há grande chance de ocorrer alguma deformação: se elas forem aceitáveis, tudo bem, caso contrário, usa-se estacas como apoio.

Mas como posso estimar o recalque que o piso pode apresentar? Por meio de ensaios mais sofisticados, como os executados em laboratório com amostras indeformadas (ensaio endométrico) ou ensaios de campo mais apropriados, como o CPTu (ensaio de cone), DMT (dilatômetro de Marchetti) etc. Nós temos tido bons resultados de previsão de recalques com o DMT e achamos bastante apropriado o seu emprego.

Uma vez conhecido o valor de recalque, em função da utilização do piso, posso aceitá-lo, adotando a fundação direta, ou não, partindo para o estaqueamento. É muito importante que o cliente final participe dessa decisão, pois é quem irá se defrontar com eventuais problemas operacionais de um piso deformado ou com os custos de um piso estaqueado.

Há situações que são bastante óbvias para definir o piso como estaqueado, casos em que as sondagens demonstrem a existência de lâminas espessas de solo adensável, caso das argilas orgânicas ou marinhas, próximas à superfície. Uma lâmina de argila orgânica com SPT ao redor de zero, com dois metros de espessura e situada dentro do horizonte de influência do bulbo de tensões gerado pelo carregamento, já pode provocar recalques excessivos no piso.

Solos porosos, como os da bacia sedimentar o Paraná, são mais difíceis de analisar, pois apresentam baixos valores de SPT, mas tem maior capacidade de suporte do que os solos de decomposição de rocha para valores similares de N, além de muitos deles serem colapsíveis. Por outro lado, quando compactados apresentam aumento expressivo da capacidade resistente, permitindo a sua utilização como elemento de fundação do piso.

Calcular, ou melhor, estimar o recalque que um piso vai sofrer tendo como base ensaios geotécnicos, não é uma muito difícil, desde que se tenha o conhecimento adequado e as ferramentas de cálculo apropriadas, como os diversos softwares disponíveis. Um bom engenheiro geotécnico dá cabo dessa tarefa.

O difícil é, uma vez tendo em mãos os resultados, decidir pelo estaqueamento ou não do piso. Todo piso em fundação direta irá apresentar alguma deformação, pois isso é inerente à própria natureza elástica do solo. Quando o solo não é adensável, isto é, não está sujeito a deformações além das elásticas, os recalques são da ordem de milímetros ou décimos de milímetros. Entretanto, a presença de camadas com deformações plásticas, que não retornam à sua posição original após descarregadas, irão apresentar recalques.

O problema é que quando questionamos ao cliente: qual é a deformação admissível para sua operação, a resposta em 99,9 % dos casos é zero, ou seja, a priori, ninguém quer ver seu piso com recalques, mas quando ele toma consciência do custo, começa a compreender e aceitar que alguns recalques são admissíveis e que a decisão do que fazer também é, em parte, sua responsabilidade.

O que é um recalque admissível? Essa é a pergunta mais difícil de responder, pois apresenta uma componente técnica, que é o tipo de operação que o piso estará submetido e de uma componente estética: eventuais fissuras irão incomodar? Isso é de pessoa para pessoa e os efeitos colaterais da deformação tem que ser bem esclarecidos com o cliente.

Sob o ponto de vista operacional, áreas de armazenamento operados com ponte rolante, como depósitos de bobinas, são pouco afetadas pelo recalque; áreas com carga uniforme operadas com empilhadeiras são também pouco afetadas, mas mais que a anterior; operações com portapaletes exigem mais cuidado, mas ainda é possível tolerar algum recalque. No caso de empilhadeiras trilaterais a condição é bem mais rigorosa e em câmeras frigoríficas, mais ainda.

Portanto, o tipo de fundação que vamos empregar para o piso necessita de uma análise aprofundada das características do solo e do tipo de operação prevista e, sempre que necessário devemos recorrer a ensaios mais específicos que nos deem respostas mais confiáveis.


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